quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Um processo sem fim

Na passagem do Prólogo para a Cena 1, uma voz em off diz:

"É tão difícil desvendar a verdadeira causa, os verdadeiros fios de uma ação – inclusive em seus aspectos mais simples – quando tudo o que se tem são os restos mortais de todas as épocas reunidas na desoladora visão de uma terra arrasada: destroços por todos os lados; ruínas; fragmentos".

Certamente uma angustia acompanha a todos os que se dedicam em buscar a "verdade", seja ela religiosa, científica, política, econômica, amorosa... E artística!

"Sub:Werther" continua sendo nosso trabalho mais difícil. Na segunda fui ao ensaio e testemunhei a tentativa de meus amigos em aproveitar as melhores idéias da versão nova do texto com a versão antiga. O trabalho é de colaboração e eles têm o direito de mexer na dramaturgia proposta - esse é o desafio deste tipo de processo.

No dia seguinte, liguei para Marco André e juntos compartilhamos a sensação de que algo estava se perdendo sem que nada mais contundente estivesse sendo colocado no lugar. Acontece que a primeira versão de Sub:Werther, ainda que tivesse problemas estruturais (ao nosso ver, não que isso chegasse ao público), era um exemplo do rigor, da disciplina e da plasticidade que sempre buscamos em nossos trabalhos. Havia uma sustentação de climas, atmosferas, situações e sentimentos, que transmitiam aos espectadores a sensação de que algo estava acontecendo ali.

A vontade de mudanças era legítima: concluímos que Sub:Werther estava na faixa de transição entre um espetáculo de narrativa mais clara e linear (Projeto K) e outro em que a narrativa era dada por associação de imagens (Lobo No1 [a estepe]), e que portanto trazia em seu escopo uma incômoda esquizofrenia. Reestrear o espetáculo nos pareceu o momento oportuno de executar mudanças.

Entretanto, algumas pedras se colocaram no meio do caminho: 
- a entrada de um novo ator: Jaime Leibovitch, o nosso Goethe, saiu e em seu lugar entrou Ricardo Kosovski. Por um lado isso foi ótimo, afinal, sempre desejamos ter a dobradinha Ricardo-Pedrinho, até para aproveitar a semelhança entre pai e filho (Goethe e Werther). Acontece que a peça é fruto de um processo de meses e Ricardo tinha a dura missão de se integrar ao trabalho em dias.
- o pouco tempo de ensaio: o que já torna difícil reensaiar, o que diria então recriar?!
- o fato de Marco André estar estreando um outro trabalho na semana anterior: o processo é colaborativo, mas a palavra final é dele. Dependemos de sua presença, em todos os sentidos.
- a falta de verba para se mudar elementos, como  trilha sonora, iluminação, cenário ou figurino.

Todos esses fatores associados engessaram nossas ações, transformando obra em reforma: não poderíamos aprofundar mudanças, mas, tão somente, cortar ou acrescentar diálogos. O que aconteceu, então, foi que minhas sugestões se apresentaram como maquiagem, ou novos acessórios a um texto que, com todos os seus defeitos, estava bastante bem organizado. A remenda não funcionou e o barco me pareceu à deriva, pronto para naufragar.

Depois da nossa conversa por telefone, decidimos, Marco e eu, voltar com a primeira versão do espetáculo. Mandei um e-mail convocatório para os atores e cheguei ao ensaio com duas cópias do texto antigo. Claro que o anúncio de que voltaríamos a versão anterior causou certo mal estar, afinal, estamos a três dias da estréia; mas, graças à compreensão e disponibilidade do elenco, não foi difícil um retorno, nem para os que já fizeram o espetáculo, nem para Ricardo, que em verdade teve que fazer poucas marcas novas e decorar uma fala ou outra a mais.

Às 2 e meia da manhã de ontem pra hoje, terminamos o passadão, já com a versão anterior do espetáculo recuperada (mas, evidentemente, acrecescida de cortes e acréscimos que se mostraram eficientes na nova versão). 

Todos cansados, mas com a sensação de dever cumprido. Eu, mais tranqüilo.


WALTER DAGUERRE

Um comentário:

Unknown disse...

Sou um ator de muito talento .Como posso entrar para sua companhia.